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sábado, 22 de janeiro de 2011

Vóvo Maria

Vóvo Maria foi a única vó que conheci. Vóvo Cóta, a mãe de mamãe, só por retrato. Ela passava alguns meses do ano lá em casa, era quando fazia todos os exames. Vinha mesmo sem gostar muito, o que ela gostava mesmo era da roça. Neste tempo que passava em casa guardava tudo que ganhava para levar para Colatina: latas de biscoitos e chocolates. Ela era um pouco gorda e não sabia ler, ainda não existia tv, ela ficava sentada vendo os outros trabalharem. Ali não era a praia dela e lá em casa tinha três ajudantes. Toda noite queria jogar bisca e procurava parceiro, mas eu era a única que jogava ás vezes. Ela embaralhava o baralho e dizia que fazia "camacho", um truque para as cartas boas ficarem com ela.

Quando tocava o telefone, vóvo falava me dá uma vontade de "churar".... ela falava meio italianado e na casa dos outros filhos todos a chamavam de Nona, Mamãe tratava ela por mãe como era o costume italiano. Morreu depois que eu estava casada, teve um problema de coração. Quando fomos arrumar as coisa dela para mandar para colatina encontramos latas de biscoitos que tinham virado pó de tanto tempo que estavam guardadas. Foi enterrada em Vitória. Mas como o desejo dela era ser enterrada em Colatina, alguns anos depois, papai mandou colocar os ossos em uma caixa para ser levada para lá. Quem levou foi Otto, quando o trem chegou na estação, em Colatina, ele desceu, mas esqueceu a caixa. Quando já estava saindo Otto gritava "espera um pouco os ossos de minha vó estão no trem", todo mundo ria! Colocou a caixa sobre o guarda roupa para ser levada para a casa de Tio Vitório no dia seguinte, mas madrinha disse que não ia dormir com vóvo em cima do armário e levaram a caixa no mesmo dia. Tudo virava motivo de gozação.

Quando acabei o Ginásio não continuei os estudos. Lá em casa quem estudou mais foi Odete que fez o normal e acho que desaprendeu o pouco que tinha aprendido no colegial e Dulce, que sempre foi a mais inteligente, fez o classico, que era como o cursinho. Aqui em Vitória só tinha a faculdade de direito, onde Américo e Raul se formaram. Quem fazia outra faculdade tinha que ir para o Rio, Arildo fez engenharia lá.

Fui aprender prendas domésticas, comecei a bordar com D. Cora, ficavamos sentadas na varanda da casa dela e tinhamos que levar tarefa para casa, eu gostava. Qualquer folguinha que tinha ficava no meu quarto lendo sem parar, era o que eu mais gostava de fazer. Uma vez fui no Empório e comprei vinte e cinco romances de uma vez, papai nem percebeu quando pagou a conta, achei ótimo! Comecei a aprender Corte e Costura lá na capixaba. Era bom porque assim tinha motivo para sair de casa. Estes aprendizados me valeram para a vida toda e estão valendo até hoje, pois bordo para uma creche.

Durante as aulas de bordado, além de diversas outras coisas, bordei dez camisolas para meu enxoval de cambraia de linho. A primeira vez que usei, Raul falou que só gostava de camisola que escorregava, como cetim ou naylon. Minha decepção foi grande, engavetei as camisolas que depois viraram camisinhas e camisolas de bêbe.

Eu e Cléa sempre iámos nos bailes do Saldanha. Um dia o rapaz de terno branco, como era chamado, tirou Cléa para dançar enquanto eu dançava com outro rapaz. Nós davamos sorte, muitas meninas tomavam chá de cadeira e nós estavamos sempre sendo tiradas para dançar. Depois de dançar com Cléa, ele me tirou e foi logo perguntando o meu nome, o que eu não gostava, quando dançava a primeira vez era quando a pessoa ficava querendo conversar. Disse que meu nome era genoveva, ele ficou calado, quando a música parou ele foi perguntar a um conhecido meu se este era mesmo o meu nome e o amigo falou todos chamam de Heny mas acho que o nome dela e este mesmo. Depois disso nunca mais vi o rapazinho de terno branco, isto foi em agosto. No último semestre do colégio teve um retiro e lembrei que uma das minhas colegas era amiga do tal rapaz fui perguntar o nome dele e descobri logo... Em dezembro recebiamos montes de convite de formatura, como sabia que ele estava fazendo contabilidade procurei e achei o nome dele em um convite, fui a formatura, chamaram o nome dele mas ele não apareceu, fiquei decepcionada. Neste semestre teve uma grande festa no Palácio Anchieta, como ninguém lá em casa quis ir, fui com Arlethe e Américo. Mandei fazer um vestido lindo de tule e renda guipir, comprei uma estola de pele na D. Abigail, uma senhora que so vendia coisas boas, e fui para a festa, que por sinal não foi grande coisa, a mãe do governador havia morrido três dias antes. No reveillon deste ano, 1951, fomos ao baile com Arlethe. Eu, com meu vestido lindo, vi o tal rapaz que não estava de terno branco mas muito elegante com um terno escuro, começamos a dançar e estamos dançando até hoje, ás vezes na corda bamba, mas vamos indo.

5 comentários:

  1. Adorei!!!!!!!Ri e me emocionei!Me lembrei de muita coisa! Inclusive de Vovó Maria, e deste seu estido! Era lindo! A tia escrevi mais...Sempre fico eswperando, mais e mais!!!Beijos!Denise

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  2. Essa minha mãe é uma eterna apaixonada.....corda bamba....uhummmm....sei sei.

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  3. Mãe,muito lindo! Você tem que contar de como vc era na adolescencia... jogando os vestidos no chão e dando todos depois de usar uma vez pras empregadas... e como era geniosa... vc me disse!!!!

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  4. agora descobri a quem puxei de ficar guardando as coisas hahahaha

    adoei a historia de hoje dos ossos da minha trisavó...

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  5. Olá...sou amiga da Mel, mas não podia deixar de comentar e dizer que simplesmente AMEI esse blog..ri muito com o pouco que li, imagino que tenha muito mais coisas interessantes a contar. Também me vi num túnel do tempo, pensando como seria viver numa época em que a TV ainda não existia, os sentimentos eram mais puros...saudades de uma época que nunca vivi!:)
    Algumas coisas parecem com as histórias de minha avó, principalmente o baile quando dançou à primeira vez com o vovô... :)
    Parabéns Sra Maria...continue escrevendo..

    Beijos

    Deborah Garcia

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